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Cultura de Borla

A Cultura que não tem preço.

Espetáculo do Dia Mundial do Teatro!

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No Dia Mundial do Teatro, abrimos as portas ao público e convidamos todos a virem ao teatro. A entrada é livre consoante o levantamento de bilhete. Viva o Teatro!


"Caros amigos,
Enquanto o mundo se mantém suspenso, a cada hora e minuto, a uma profusão diária de reportagens noticiosas, será que posso convidar-nos, enquanto criadores, a mergulharmos no nosso enfoque, esfera e perspetiva específicas acerca de: tempo épico, mudança épica, reflexão épica e visão épica? Vivemos um período épico da História e as profundas e consequentes mudanças que estamos a experienciar nas relações dos seres humanos consigo mesmos, entre si, e para com mundos não humanos, estão praticamente para lá das nossas capacidades de compreender, articular, falar e expressar.
Nós não vivemos num ciclo noticioso de 24 horas, nós vivemos à margem do tempo. Os jornais e os meios de comunicação estão completamente desequipados e são incapazes de lidar com o que estamos a experienciar.
Onde está a linguagem, quais os passos e quais as imagens que nos permitirão compreender as profundas alterações e ruturas que experimentamos? E como poderemos transmitir o conteúdo das nossas vidas, neste preciso momento, não como reportagem mas enquanto experiência?
O teatro é a forma artística da experiência.
Num mundo fustigado por extensas campanhas de imprensa, experiências simuladas, prognósticos sinistros, como podemos alcançar além da infindável repetição de números, para experienciarmos a santidade e infinidade de uma vida única, de um ecossistema único, de uma amizade, ou da qualidade de uma luz num céu estranho? Dois anos de COVID-19 toldaram os sentidos às pessoas, restringiram as suas vidas, quebraram ligações e colocaram-nos num estranho grau zero da vida humana.
Que sementes é preciso semear e voltar a semear nestes anos e quais as espécies invasoras que, excessivamente crescidas, necessitam de ser total e finalmente removidas? Há tantas pessoas que estão no limite. Tanta violência que deflagra, irracional ou inesperadamente. Há tantos sistemas estabelecidos que foram expostos como estruturas de crueldade continuada.
Onde estão as nossas cerimónias de evocação? De que precisamos de nos lembrar? Que rituais nos permitem finalmente reimaginar e começarmos a ensaiar passos que nunca tenhamos dado antes?
O teatro de visão épica, de propósito, de recuperação, reparação e cuidado precisa de novos rituais. Nós não precisamos de ser entretidos. Precisamos de reunir. Precisamos de partilhar espaço e precisamos de cultivar espaço partilhado. Precisamos de espaços protegidos de audição profunda e de igualdade.
O teatro é a criação na terra de um espaço de igualdade entre humanos, deuses, plantas, animais, horas de chuva, lágrimas e regeneração. O espaço de igualdade e audição profunda é iluminado pela beleza escondida, mantida viva numa interação profunda de perigo, equanimidade, sabedoria, ação e paciência.
N’ O Sutra da Guirlanda de Flores, o Buda elenca dez tipos de grande paciência da vida humana. Uma das mais poderosas é a denominada Paciência de Perceber Tudo como Miragens. O teatro sempre apresentou a vida deste mundo aparentando-a com uma miragem, possibilitando-nos ver através da ilusão, deceção, cegueira e negação humanas, com uma claridade e uma força libertadoras.
Estamos tão certos daquilo que vemos e da forma como vemos que não somos capazes de ver e sentir realidades alternativas, novas possibilidades, abordagens diferentes, relações invisíveis, conexões intemporais.
Este é um tempo para um profundo refrescar das nossas mentes, dos nossos sentidos, das nossas imaginações, das nossas histórias e dos nossos futuros. Mas este trabalho não pode ser feito por pessoas sozinhas, trabalhando isoladamente. É um trabalho que precisamos de fazer juntos. O teatro é o convite para fazermos este trabalho juntos.


Um profundo obrigado pelo vosso trabalho. 

Peter Sellars"

 

 

 

Tradução para Língua Portuguesa: Ricardo SIMÕES, PT / Teatro do Noroeste - Centro Dramático de Viana, Portugal.