Palácio Nacional de Queluz - Parques de Sintra inicia recuperação do Jardim de Malta
A Parques de Sintra iniciou no final de fevereiro o projeto de recuperação do Jardim de Malta, no Palácio Nacional de Queluz. A intervenção visa reconstituir e requalificar esta área, devolvendo-lhe o traçado setecentista e o caráter lúdico e interpretativo original. O projeto deverá estar concluído em dezembro e representa um investimento de meio milhão de euros.
Construído entre 1758 e 1765, este jardim de aparato desenvolve-se no ângulo da fachada interior do Palácio, entre a Sala do Trono, a Sala da Música e a ala dos Aposentos da Princesa D. Maria Francisca Benedita, e é uma peça fundamental para a leitura integrada dos Jardins de Queluz. Projetado, provavelmente, por Jean Baptiste Robillion, segue os preceitos de composição dos jardins formais setecentistas, refletindo os valores de ordem, clareza, proporção e harmonia.
É um jardim de estilo formal, em parterre (superfície plana) de buxo, composto por desenho geométrico ou em broderie, como se fosse um bordado ou um tapete, e pensado para ser apreciado como uma peça de arte. Assim, as linhas e os ornamentos de buxo eram talhados a um nível baixo e o jardim tinha vários degraus para permitir um ponto de observação mais elevado. As peças de água, as balaustradas e a estatuária, esculpida em pedra e em chumbo, completavam o traçado do jardim, cujo programa é de entretenimento, evocando a alegria pueril.
A partir de 1807, com a ida da família real para o Brasil perante as Invasões Francesas, e mais tarde com a guerra civil, as propriedades reais foram votadas a um longo período de abandono e incerteza. Só no final do séc. XIX há notícias consistentes de permanência e usufruto de Queluz através das obras de conservação levadas a cabo pelo rei D. Carlos, que converte o jardim ao gosto da época, o Romantismo. Nesta fase, introduziram-se palmeiras e outras plantas exóticas, conferindo ao jardim um registo naturalista.
Ao longo do século XX, sucedem-se várias intervenções. Em 1918, introduzem-se quatro estátuas provenientes do Mosteiro de São Vicente de Fora e, por volta de 1938/39, no decorrer de uma campanha de obras realizada pela Direcção-Geral dos Edifícios e Monumentos, removem-se os quatro lagos angulares ali existentes. A topiária – a arte de talhar e confinar as árvores e os arbustos a formas específicas – não foi executada com a rotina e rigor necessários e o buxo, bem como outras espécies ali plantadas (murta e azereiros), foram crescendo de forma natural, o que levou à perda do formalismo original.
Recuperação do traçado setecentista
A intervenção agora em curso, que se iniciou com a remoção dos quatro ciprestes plantados no Jardim de Malta já nos anos 40, visa reconstituir e requalificar este espaço, devolvendo-lhe a leitura e carácter setecentista do traçado.
O projeto foi precedido de uma longa investigação, que permitiu levantar a documentação histórica sobre a construção e evolução do jardim e sobre as regras definidas pelos Tratados de Jardinagem do século XVIII para os parterres, sustentando de forma consistente as tomadas de decisão.
A situação atual caracteriza-se pela degradação da estrutura verde, já que o buxo cresceu demasiado, sendo hoje impossível conformá-lo ao tamanho adequado. Um estudo fitossanitário realizado pelo Laboratório de Patologia Vegetal “Veríssimo de Almeida”, do Instituto Superior de Agronomia, da Universidade de Lisboa, revelou ainda a existência de pragas e doenças, como o míldio do buxo, um fungo para o qual não existe cura e que tem dizimado os jardins de buxo por toda a Europa, obrigando ao levantamento integral dos parterres e à substituição do buxo por outras espécies com comportamento semelhante. Um outro estudo efetuado pelo Laboratório de Dendrocronologia da Universidade de Coimbra demonstrou também que a grande maioria do buxo é jovem (idade inferior a 50 anos), havendo alguns exemplares notáveis.
Na sequência deste diagnóstico, a Parques de Sintra irá proceder ao transplante do buxo jovem para recuperação da topiária noutras zonas dos Jardins de Queluz, enquanto os exemplares antigos e notáveis serão transplantados para os talhões do bosquete onde poderão crescer naturalmente. Um estudo encomendado ao Royal Botanic Gardens de Kew concluiu, de resto, que a taxa de sobrevivência do buxo a ser transplantado será elevada, tendo sido definidos os métodos de proteção, de movimento das plantas, os recursos materiais e as recomendações adequadas para garantir a sobrevivência dos exemplares transplantados.
Tal como acontece nos jardins europeus e de acordo com as recomendações internacionais, que desaconselham a introdução de exemplares de buxo como medida de prevenção contra o míldio, a replantação do traçado setecentista no Jardim de Malta será feita com murta.
No que diz respeito à estrutura decorativa, o projeto prevê o restauro e conservação da estatuária, das balaustradas, do lago central, dos degraus e cantarias, bem como o restauro e regresso ao Jardim de Malta dos quatro lagos angulares e respetivos grupos escultórios. Manter-se-ão as estátuas vindas do Mosteiro de São Vicente de Fora.
Proceder-se-á ainda à escavação arqueológica do local, à reconstituição do efeito cénico e dinâmico das peças de água do jardim, à execução de novas infraestruturas hidráulicas e de energia e à execução de pavimentos.
Com o propósito de conciliar questões de segurança com a política de “Aberto para Obras” da Parques de Sintra, a área de intervenção está delimitada por um conjunto de painéis que conta graficamente a história do Jardim de Malta desde o seu planeamento até ao presente e antecipa o resultado futuro após a concretização do projeto. Ao percorrer os painéis, os visitantes encontrarão vários pontos de observação, nomeadamente janelas, através dos quais poderão acompanhar a evolução da obra. Neste recinto, dentro de um pequeno pavilhão, será exibido um filme de animação alusivo aos mesmos temas.