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Cultura de Borla

A Cultura que não tem preço.

"Veraneantes" marca regresso de Nuno Cardoso ao Centro Cultural Vila Flor (01 abril)

Peça de Máximo Gorki, com mais de um século, serve de crítica feroz à sociedade atual

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Este sábado, 01 de abril, às 21h30, o Grande Auditório do Centro Cultural Vila Flor, em Guimarães, recebe a mais recente encenação de Nuno Cardoso, “Veraneantes”. A peça escrita há mais de cem anos por Máximo Gorki coincide com o definhar do Império Russo e é agora transposta, com a mestria do encenador, para a leviandade da cultura de consumo dos nossos dias. Temos a internet na ponta dos dedos, sabemos tudo a toda a hora, e no fundo não fazemos nada. Nuno Cardoso põe-nos desconfortáveis na cadeira e previne-nos de que o mundo não será salvo com os likes no facebook.

 

É novamente verão e quatro famílias burguesas vão, como de costume, para o destino de férias. O clima social e político ominoso que espreita estes veraneantes para lá do horizonte em que vivem cria as condições perfeitas para que do torpor do lazer irrompa a tempestade perfeita de aborrecimento, frustração, medo e ciúme. E é no meio dessa tempestade, do jogo de forças que se desencadeia entre as personagens, que se pinta um quadro rasteiro das aspirações do homem, num imenso coral à pequenez e ao desencanto.

 

Do advogado insensível à mulher, da mulher que anseia por uma saída ao irmão imóvel na sua cobardia. Do avarento traído pela mulher, da mulher que faz da devassidão uma ode ao desespero, ao amante que assume a sua condição como suicídio moral. Do escritor desiludido que foge à confrontação com o seu próprio falhanço, do velho generoso que não encontra na família o porto de abrigo, à mulher que não consegue ultrapassar o seu medo para ser feliz. De um início aparente normal até a um fim abrupto e desesperançado, “Veraneantes” cria uma imensa tapeçaria de desejo e frustração que autopsia, então e agora, a nossa impotência perante o desenrolar da vida a caminho de um futuro assustador e frio para lá do presente estival.

 

“Veraneantes” é uma peça sobre a classe média na era do consumo, mas também uma reflexão sobre nós mesmos enquanto indivíduos e agentes sociais. Para Nuno Cardoso, traduz o culminar de uma série de acontecimentos complexos que se vêm desenrolando desde 2008 e que quase conduziram a uma cegueira generalizada em que ficamos presos em círculos sociais. “É um espetáculo de atores que, ao longo de duas horas e pico, discorrem de uma forma às vezes picara, outras trágica, sobre as relações entre pessoas normais. Os seus sonhos, as suas ambições e os seus medos”.

 

Nesta encenação, Nuno Cardoso cede à urgência de pôr o dedo na ferida e falar de um mundo que, de tão cheio, se torna vazio. Vivemos tempos de um consumismo sôfrego, de um moralismo exacerbado que tudo engole e que faz com que todos tenhamos uma palavra a dizer sobre tudo, ao mesmo tempo que permanecemos em total apatia, prostrados ao mundo a acontecer diante de nós, mas sem nunca agir. Uma fatia da sociedade que se perde “entre redes sociais, esplanadas do Porto turístico, ‘happy hours’, ‘fashion trends’ e essas palavras todas”. “Estamos neste mundo e achamos tudo muito mal, mas naquilo que estamos, de facto, interessados é em saber quantos ‘likes’ temos no ‘facebook’”, reflete o encenador que acredita que estamos no auge da regressão social. Sem qualquer receio, Nuno Cardoso pega em “Veraneantes” para fazer uma crítica mordaz à sociedade atual da qual todos acabamos por ser cúmplices, de uma forma ou de outra: “No meio disto tudo discute-se cidadania com ‘hashtags’”.

 

Com esta peça, a Ao Cabo Teatro e Nuno Cardoso retomam o périplo pelo reportório da dramaturgia russa, depois de “A Gaivota” e “As Três Irmãs”, peças que também subiram ao palco do CCVF em 2010 e 2011, respetivamente. Mas se em “As Três Irmãs”, de Tchékhov, ainda se adivinhava a esperança de um amanhã, nas suas herdeiras criadas por Máximo Gorki assistimos simplesmente a uma confissão: “Não conhecemos ninguém que seja feliz”. Eulogia de um futuro, seja ele qual for.

 

Os bilhetes para o espetáculo encontram-se à venda nas bilheteiras do Centro Cultural Vila Flor e da Plataforma das Artes e da Criatividade, bem como nas lojas Fnac e El Corte Inglês, entre outros pontos de vendas, e na internet em www.ccvf.pt e oficina.bol.pt.